Operação Graneleiro desmantela organização criminosa especializada em furto e desvio de cargas de grãos
Operação é uma ação integrada com a Brigada Militar, PRF e Polícia Civil, realizada com o intuito de desmantelar organização criminosa especializada no desvio de cargas de grãos. Foi causado um prejuízo superior a um bilhão de reais. Mais de 100 ordens judiciais estão sendo executadas no RS e SC
Desde meados do mês de maio de 2020, a DRACO de São Luiz Gonzaga/RS, num trabalho conjunto com outras Delegacias do RS, BM, PRF e Comando Rodoviário da BM, investiga uma organização criminosa especializada em furto/desvio de cargas de grãos (soja, arroz, trigo, milho). O grupo criminoso, integrado por pelo menos 26 pessoas, atuava de maneira empresarial, com posições definidas de chefia, pessoas encarregadas da contratação de fretes, recrutamento de motoristas, compra e manutenção de caminhões e “laranjas”, que serviam para o registro de caminhões, imóveis, empresas fantasmas e demais investimentos da renda obtida com os crimes. De acordo com estimativas feitas pela Polícia Civil, o prejuízo causado pela organização criminosa, durante os cinco anos de atuação, supera a cifra de um bilhão de reais, perda suportada principalmente por empresas do ramo de seguro de cargas.
O grupo era comandado por três homens, um deles residente em Ijuí/RS e dois em Cruz Alta/RS, sendo que dois deles já foram presos em julho desde ano, na cidade de Cruz Alta/RS, numa operação integrada entre Polícia Civil, Brigada Militar, PRF e Comando Rodoviário da BM. Na ocasião, o grupo criminoso foi monitorado desviando uma carga de 39 toneladas de arroz, que ia de Pelotas/RS a Imperatriz/MA – naquela ocasião, 08 homens foram presos. O outro chefe do empreendimento criminoso foi preso preventivamente nesta manhã, na cidade de Ijuí/RS, ocasião em que também foram feitas buscas em sua casa, sendo apreendidos objetos e veículos relacionados com a investigação.
A ofensiva policial, que foi realizada de forma simultânea em 9 cidades do RS e em 3 de SC, envolveu cerca de 150 policiais e 40 viaturas. Foram executados 26 mandados de prisão preventiva, 28 mandados de busca e apreensão residencial, 30 mandados de apreensão de caminhões e carros utilizados/adquiridos pelo grupo criminoso, além de outras ordens judiciais.
A coordenação da operação está a cargo da DRACO de São Luiz Gonzaga, mas os trabalhos foram realizados de forma integrada com as Delegacias de Polícia Regionais de São Luiz Gonzaga, Ijuí, Cruz Alta, Santa Maria, Santiago, Três Passos e Carazinho. Cabe destacar ainda a integração dos trabalhos com a Brigada Militar nas cidades de São Luiz Gonzaga, Ijuí e Cruz Alta, além da PRF em Santiago, São Borja, Cruz Alta e Ijuí, bem como o Comando Rodoviário da BM em Passo Fundo, Santo Ângelo e Cruz Alta.
Entenda o golpe
Os chefes do empreendimento criminoso, usando de empresas de fachada e pessoas físicas “laranjas”, obtinham notas de frete (documento que autoriza a retirada de cargas nas empresas) e contratavam um motorista com “nome limpo” (o motorista não podia ter registros desabonatórios, caso contrário, a empresa e a seguradora indeferiam a retirada da carga de grãos), a quem entregavam a tal nota de frete e um caminhão, que também registravam previamente em nome de “laranjas” (muitas vezes usavam caminhões “clonados”). Depois disso, o motorista retirava a carga e saía da empresa em direção ao destino, conforme registrado na nota de frete. Em dado ponto do trajeto, os chefes do esquema, que invariavelmente acompanhavam de perto o caminhão, a bordo de um veículo também registrado em nome de laranjas, indicavam onde o motorista devia deixar a carreta carregada – empresa de guincho em Cruz Alta/RS. Nesse amplo pátio é que as carretas carregadas com grãos eram desengatadas do “cavalinho” (caminhão-trator) que “puxou” a carreta, e eram acopladas a outro “cavalinho”. O dono do guincho era quem geralmente trocava as placas da carreta (colocava placas clonadas, de outra carreta) e a carga então era levada ao novo destino, para um novo comprador. Os chefes do esquema também emitiam notas para “esquentar” as cargas, ou seja, documentos que mascaravam a origem criminosa do produto desviado. O dono do guincho ainda usava as próprias notas fiscais de produtor rural – pois mantém propriedade rural em Cruz Alta/RS – e conseguia facilmente emitir notas de produtor ou documentos similares, como se a carga tivesse sido por ele produzida.
A organização criminosa preferia sempre cargas com destinos distantes, pois nos dias em que a carga supostamente estaria na estrada (uma carga de arroz que era levada a São Paulo, por exemplo, demorava em torno de três a cinco dias para chegar), a organização criminosa conseguia desviar, com o mesmo motorista, outras três ou quatro cargas em empresas diferentes, sendo que o valor de cada carga desviada girava em torno de 60 a 100 mil reais.
O grupo criminoso planejava desviar, nesses últimos meses do ano, cerca de 30 cargas de grãos, um prejuízo evitado que pode ser calculado em aproximadamente 3 milhões de reais. Os caminhões usados nos furtos/desvios eram registrados em nomes de “laranjas”.
Chefes da organização criminosa
O mais experiente dos chefes do grupo criminoso reside em Cruz Alta e era funcionário público concursado na Câmara Municipal de Vereadores de um pequeno município daquela região. Já foi alvo de diversos procedimentos administrativos na Câmara Municipal por falta injustificada ao trabalho, mas, formalmente, continua vinculado ao serviço público. Tinha como tarefa principal planejar os furtos/desvios de cargas, contratar os fretes, contratar os motoristas, auxiliar nos registros dos caminhões adquiridos pela organização e orientar os caminhões durante os trajetos que eram adotados para os desvios das cargas. Foi possível apurar que usava a renda do crime para investir em motocicletas caras, veículos e festas, ostentando vida financeira incompatível com a função de servidor público municipal.
O outro chefe do empreendimento criminoso, também residente em Cruz Alta/RS, é empresário do ramo de guincho, prestando serviços inclusive para seguradoras veiculares. Também é advogado, produtor rural e leiloeiro oficial. Tinha boa circulação na alta sociedade de Cruz Alta/RS e mantinha bons contatos em empresas e órgãos públicos. Sua principal função na organização criminosa era ceder os galpões e pátios de sua empresa de guinchos para esconder os caminhões com as cargas desviadas, além de realizar a troca de placas das carretas e caminhões. Era ele quem também cuidava da documentação das empresas de fachada, organizava a parte jurídica do empreendimento criminoso e obtinha notas de produtor rural e até fornecia notas em seu nome para “esquentar” as cargas de grãos desviadas.
O terceiro dos “cabeças” da organização criminosa residia em Ijuí/RS e era mecânico de máquinas pesadas de profissão, sendo que também trabalhava como vendedor de veículos usados, em especial caminhões e carretas. Via de regra, era o responsável por adquirir caminhões e carretas para o grupo criminoso, possuindo diversos contatos no RS e fora dele para essa atividade. Era ele quem também providenciava no conserto de caminhões, carretas e lonas (atividades mais de cunho braçal). Mostrava-se hábil na negociação de veículos e também exercia a tarefa de recrutar motoristas para atuarem nos furtos/desvios de cargas.
Motoristas, “laranjas” e colaboradores – pessoas físicas e jurídicas
A organização criminosa ainda contava com um grande número de pessoas físicas e jurídicas como motoristas, laranjas e colaboradores. Durante as investigações policiais, foram identificadas oito empresas de fachada e 23 motoristas, colaboradores ou “laranjas”. Em relação às pessoas físicas, o Juízo Criminal de São Luiz Gonzaga decretou a prisão preventiva de todas elas, determinando, quanto às pessoas jurídicas, outras medidas cautelares restritivas.
Investimentos da organização criminosa
Conforme apurado pela Polícia Civil, e renda auferida pelo grupo criminoso era aplicada, principalmente, na aquisição de veículos novos e imóveis urbanos e rurais. Há registros de imóveis avaliados em mais de um milhão de reais sendo adquiridos por integrantes da organização criminosa em regiões nobres de Cruz Alta/RS.
O grupo ainda investia em veículos clonados, que eram adquiridos na região metropolitana e vendidos na região de Cruz Alta. Acredita-se que existam diversos veículos clonados rodando na região de Cruz Alta/RS, situação que passa a ser alvo de apuração pela Polícia Civil.